domingo, 3 de novembro de 2013

Desculpem o mutismo e o pó...

Não é estranho que até os mortos tenham seu dia? Dia este, no qual os cemitérios, os crematórios, as cruzes na beirada das estradas recebam visitantes, flores, orações, poesias, lágrimas, confissões de amor e de fidelidade, pedidos de desculpas, prantos, algumas renovadas queixas e até uma ou outra maldição? 
O morto se foi mas, por ironia, parece que do lado de lá do nada continua tiranicamente comandando a vida dos vivos e fazendo de tudo para manter presente em nós não apenas uma ou outra culpa, mas a consciência de nosso semelhante, trágico e nefasto destino... Apesar do mundo ser, segundo alguns esotéricos, o inferno de alguma longínqua galáxia, ou - segundo os céticos -, simplesmente uma zona, uma exótica penitenciária sem a possibilidade sequer de sursis, e onde todos estamos a caminho do cadafalso, morrer é algo sem sentido, bizarro, estúpido, nojento, degradante, punitivo, imoral... O funeral - observem - é a apoteose dessa indecência... 
E a idéia delirante e falaciosa da ressurreição só agrava ainda mais toda essa comédia.
Uma sugestão de epitáfio: "desculpem o mutismo e o pó!"

2 comentários:

  1. Pra mim a morte não assusta tanto quanto a passagem do tempo, fiquei velho e hoje posso dizer que os problemas de saúde são o meu inferno, e dá-lhe remédios e chás, próteses dentárias e penianas, e haja dinheiro que eu não tenho pra aliviar as dores de coluna, cabeça e outras merdas. Queria ter coragem de me matar, mas não tenho. Mas também que adianta ser jovem a vida toda e ser um sonhador? Sim porque é isso que são os jovens, uns sonhadores. Quando se chega a maturidade e a velhice, se vê a grande merda podre que é a vida...acaba a ilusão.

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  2. "Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida". - Clarice Lispector em Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres

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