segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Bestiário


Nem o escarcéu da prostituição infantil nas barbas do Ministério da Justiça, nem os tiroteios de grosso calibre nas entre-quadras e nem mesmo a derrocada do mercado financeiro internacional têm afetado a alta rotatividade dominical no zôo da cidade. Os pipoqueiros estão em transe. O milho transgênico salta em desespero nas panelas. As filas de automóveis são indescritíveis e os celulares não param de tocar lá sobre os cobertores, os lençóis e as colchas onde o pic-nic se instala. Que pensarão de nós as onças e os outros animais? Crianças e hipopótamos, donzelas e girafas, senhores e chimpanzés dividindo as pipocas e se observando mutuamente. O bestiário inteiro abanando as orelhas e chicoteando com o rabo a aluvião das moscas e o ziguezague das plumas dos flamingos. Claro que cada uma dessas grades, jaulas e cercas é um signo cruel de nossa desonestidade e de nossa tirania para com as outras espécies. Já que se tem falado tanto em “ética” e muito mais ainda em “bioética”, por que não se pensa num sursis ou pelo menos num hábeas corpus para essa fauna? Por que a Câmara – com seus duvidosos poderes – ainda não previu a clausura definitiva desta lúgubre penitenciária?

Ezio Flavio Bazzo

Um comentário:

  1. bem sugerido: abolicionismo penal também aos animais! porém, enquanto não liberamos os animais para serem animais... pais e mães continuam levando suas crianças para se verem em tamanho espelho social que é um zoológico.

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